Uma recente matéria do site americano GayCities colocou o Brasil como o primeiro da lista dos países que os turistas LGBT+ devem evitar. Os motivos citados vão do mais direto, como o alto número de crimes de ódio contra a comunidade até os mais adjacentes, como as queimadas na Amazônia. No papel de maior veículo de turismo LGBT+ do País, a Revista ViaG conversou com alguns nomes importantes que comentam com propriedade a situação atual, para mostrar aos estrangeiros (e também aos brasileiros), que continuamos como um destino onde todo mundo é bem-vindo, sim!
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Crimes de ódio contra os LGBT+, por Paulo Iotti, advogado especialista em Direito Constitucional e representante do PPS e da ABGLT na ação de criminalização da LGBTfobia
Você pode contar nos dedos os lugares no mundo que realmente são 100% seguros. Mesmo os países mais desenvolvidos possuem casos de falha nesse sistema e no Brasil não é diferente, contudo, aqui, o turista LGBT+ tem a possibilidade de proteção por lei. “A criminalização da LGBTfobia ajuda a proteger o turista LGBT+ tanto pelo efeito educativo quanto pelo efeito prático, já que o agressor pode inclusive ser processado. Isso fará muitas pessoas deixarem de praticar atos homotransfóbicos. Como a homotransfobia foi reconhecida como racismo, a lógica é a mesma, cabe denunciar. Ofensas à coletividade LGBT+ podem ser denunciadas pelo Ministério Público, que pode mover ação penal. Pessoas individuais que sejam ofendidas por homotransfobia devem fazer boletim de ocorrência por injúria racial, e ir uma segunda vez fazer a chamada representação, que é uma confirmação do interesse de abertura do processo penal. Aí o MP assume e pode denunciar”, explica Iotti.
LGBTfobia do presidente por Clóvis Casemiro, coordenador da IGLTA Brasil (Associação Internacional de Turismo LGBT)
“As falas do presidente Jair Bolsonaro referentes ao turismo LGBT+ só demonstram que ele não entende do assunto e como em outros temas, não se aprofunda em nada. Ele acredita que está combatendo o turismo LGBT+ e agradando seus eleitores conservadores mas no fundo está prejudicando toda a cadeia turística, porque, quando ataca minorias fere os direitos humanos. Qualquer turista consciente não irá viajar para destinos onde não existam garantias mínimas desses direitos universais, não só por militância mas pela sua própria segurança. Outra prova da alienação presidencial são as diversas ações em prol do turismo LGBT+, que têm sido realizadas em todo país.
– Em São Paulo, por exemplo, o Convention and Visitors Bureau criou um comitê de profissionais especializados em turismo LGBT+ para desenvolver estratégias para atrair mais eventos LGBT+ e fomentar os que já existem na cidade. – A Parada do Orgulho LGBT+ da cidade desse ano bateu todos os recordes, principalmente de público, com mais de três milhões de pessoas na rua, e o número de viajantes internacionais que se interessaram em vir para São Paulo no período do evento cresceu 40% em relação ao ano passado.
– Grandes marcas globais, como Uber, Burger King e Amstel entraram como patrocinadoras oficiais da Pride de SP, e o resultado foi a injeção de mais de 100 milhões de dólares na economia local em apenas um fim de semana.
– A prefeitura de Belo Horizonte, capital mineira, está renovando sua filiação à IGLTA. A cidade também realizou sua maior Parada LGBT+ de todos os tempos, atingindo a hotelaria e o comércio de forma muito positiva, gerando vários empregos.
– Isso sem falar do números de empresas e destinos que já são filiados à IGLTA. Somos hoje o segundo maior número de membros do mundo, atrás apenas dos EUA. É que o turista LGBT+ entenda que a fala do presidente é uma tentativa infantil e irresponsável de abalar o sucesso da indústria turística. Nosso país tem leis e justiça, e a homofobia e a transfobia são consideradas crime, o governo querendo ou não”, lembra Casemiro.
A atuação geral do presidente, por David Miranda, deputado federal e Vinicius Lummertz, secretário de turismo do Estado de São Paulo
“Apesar do Brasil ter abertamente um presidente LGBTfóbico e sermos o País que lidera o ranking de assassinatos de LGBT+ no mundo, o Brasil também lidera o ranking com a maior Parada LGBT+ do mundo e tem um povo extremamente diverso. Nós não podemos ser estampados pela cara do presidente escancaradamente LGBTfóbico, mas sim pela população brasileira que sempre foi e é calorosa, aberta e diversa. O Brasil definitivamente não é um dos piores destinos para o LGBT+ viajar no mundo, o povo é muito maior que o presidente”, afirma Miranda.
Durante o III Fórum de Turismo LGBT do Brasil, Lummertz pontuou que “o Trump é um cara chato, mas as pessoas continuam indo pra Disney, Nova York e Miami. Você pode não concordar e ir”.
É importante ressaltar que a performance deplorável do presidente não é mal vista apenas no exterior, ela também tem desagrado o brasileiro, já que Jair Bolsonaro não para de ficar impopular. Uma recente pesquisa da agência de notícias da CNT (Confederação Nacional do Transporte) revelou que o desempenho pessoal do presidente sofreu um aumento de desaprovação em mais de 25% nso últimos meses, indo de 28,2% em fevereiro para 53,7% em agosto. Outra pesquisa realizada pela XP/Ipespe (Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas) mostra que 41% acham o governo atual ruim ou péssimo, um dado que se elevou em relação a fevereiro deste ano, quando 17% opinaram negativamente sobre ele.
Turismo voltado para o público LGBT+ por Alex Bernardes, diretor comercial da Revista ViaG, idealizador e criador do Fórum de Turismo LGBT do Brasil
De acordo com Bernardes, “apesar do discurso completamente leviano e equivocado do presidente atual, querendo afastar o turista LGBT, é importante ressaltar que ele não é o País (e inclusive não representa boa parte da nação). Tanto as empresas quanto os destinos internos e a maioria dos brasileiros, querem sim o turista LGBT+ aqui, inclusive o setor nunca esteve tão em alta no Brasil como agora, já que dispõe de produtos pensados e montados especificamente para a comunidade. Nossa indústria turística já entendeu o tamanho e a importância desse segmento. E cada vez mais, destinos, hotéis e prestadores de serviço da cadeia de turismo estão em busca de treinamento, capacitação e divulgação para atrair esse perfil de viajante. Um exemplo claro desses esforços é o Fórum de Turismo LGBT do Brasil, que dobra de tamanho a cada ano e já envolve mais de 40 empresas do turismo patrocinando e apoiando o evento”.
Com a palavra, os estrangeiros!
Parece mas não é por diz Felipe Cardenas, presidente da Câmara de Comércio LGBT da Colômbia
“Estive recentemente no Brasil para participar de um evento profissional e me surpreendi com o que vi. Eu imaginava que iria encontrar um País com medo e uma comunidade LGBT+ recolhida, perseguida e amedrontada, mas quando eu cheguei em São Paulo pude perceber que não é bem assim. Visitei bares, restaurantes e bairros inteiros onde a população LGBT está na rua se divertindo, dançando, de mãos dadas, trocando carinho sem medo algum e sem sofrer qualquer tipo de repressão. Não acho justo que o País esteja sendo prejudicado por ter um presidente que fica por aí criando polêmicas sem o menor embasamento”, diz Cardenas.
Investimentos do Reino Unido no turismo LGBT+, por Malcolm Griffiths, diretor do VisitBritain no Brasil
Segundo Griffiths, “embora a economia do Brasil esteja crescendo menos do que o esperado, o País permanece com uma estratégia de mercado para o universo do turismo. Da população de 210 milhões de pessoas, de acordo com o estudo do IBGE do ano de 2018, mais de 11,5 milhões de brasileiros viajaram para o exterior, um aumento de quase 10%. Com essa crescente tendência, o Brasil continua sendo um mercado importante para o turismo. Nós da VisitBritain e nossos parceiros do Governo Britânico continuamos nosso investimento no Brasil para engajar a comunidade LGBT+ do país com a nossa plataforma de marketing sobre diversidade Love is GREAT, projeto desenvolvido para demonstrar os valores da Grã-Bretanha com relação aos direitos LGBT+ e a inclusão dos direitos humanos.
Em 2019 nós temos um cronograma cheio de atividades com a Love is GREAT, incluindo nosso suporte para o mais recente festival LGBT+, chamado Love Noronha, em uma ilha paradisíaca localizada no nordeste do País. Além de uma próxima atividade nos eventos esportivos LGBT+ em conjunto com o time de futebol Unicorns Brazil. Durante os últimos anos, nós também participamos de muitos eventos comerciais da indústria de turismo que apoiam esse importante nicho, assim como participamos das Paradas do Orgulho LGBT+ em Belo Horizonte, Recife, São Paulo e Rio de Janeiro.
Para turistas LGBT+ estrangeiros que querem visitar o Brasil, nunca houve momento mais apropriado senão agora, aproveitando ao máximo a diferença das moedas mais fortes, contrapondo o Real desvalorizado. Além disso, para países como Estados Unidos e Austrália, não há mais a necessidade de vistos de turista para entrar no País, ficou ainda mais fácil fazer uma visita. A percepção sobre o que se vê nas notícias sobre o Brasil não traduz a realidade. A comunidade LGBT+ está de portas abertas para receber visitantes internacionais”.
“Segura e bem-vinda” por Merryn Johns, edita-chefe da Curve Magazine, a maior publicação lésbica da América
“Já estive duas vezes no Brasil e gostei bastante de ambas. Minha primeira visita foi à Floripa há alguns anos, cidade que eu achei muito bonita e segura. Eu amei a beleza natural, bem como a hospitalidade das pessoas. Minha segunda visita, em agosto de 2019, foi à São Paulo, por ocasião de uma viagem internacional à imprensa LGBT+. Enquanto em São Paulo, eu via nas redes sociais muitas notícias ruins, sobre os incêndios na Amazônia, relatos de aumento do crime no Rio de Janeiro e os problemas de viver com o governo conservador de Bolsonaro. Mas o fato é que, enquanto eu estava andando pela cidade e conhecendo outras pessoas LGBT+, me senti muito segura e bem-vinda. É verdade que existem muitas pessoas sem-teto no centro de São Paulo, mas elas se mantêm em sigilo e não fomos assediados. Agora, fui assediada por pessoas sem-teto na Califórnia! Fomos aconselhados a tomar cuidado no Brasil com nossas malas e iPhones por conta dos batedores de carteira, mas não houveram incidentes para relatar nesta viagem, porém, fui roubada em Paris, por exemplo.
Ainda na capital paulistana, eu e duas outras mulheres fomos ao bar de lésbicas Bitú, onde fizemos novas amigas e fomos tratadas maravilhosamente bem. Nós sentimos muito seguras, inclusive, um de nós ficou até às 3 da manhã e conseguiu pegar um Uber de volta ao hotel sem problemas. Também peguei vários Uber sozinha à noite por São Paulo e não tive problemas. Disseram-me uma noite, no entanto, que os assaltos na cidade haviam aumentado e isso fazia com que algumas pessoas ficassem em casa. Mas eu venho da cidade de Nova York, que também é uma cidade grande, com crimes, e isso não me impede de sair e aproveitar o melhor dela. Todo viajante precisa estar seguro, tomar precauções e usar o bom senso ao sair ou se deslocar por um novo lugar”, destaca Johns.
Vale lembrar!
O Brasil possui regiões consolidadas e preparadas para receber nossa comunidade, “como é o caso de Florianópolis, no sul do País, que já foi sede de uma convenção da IGLTA e recebe turistas LGBT+ há anos. Temos também as cidades de Recife e Salvador no nordeste brasileiro, que desde 2011 fazem campanhas diversas e grandes festivais de música voltados para esse público, reunindo milhares de pessoas todos os anos. Brasília, Belém e Goiânia trazem o Norte e o Centro-Oeste com boates super estruturadas e festas especificamente LGBT+. As maiores cidades, Rio de Janeiro e São Paulo já são mundialmente famosas pela sua oferta de atrações para a nossa comunidade. Grande ou pequeno, toda capital do País dispõe, ou de um barzinho ou de um evento pensado e direcionado para a comunidade LGBT+. Sem falar nos inúmeros discursos, workshops, palestras, fóruns, e ações que acontecem diariamente nas empresas e nas ruas, debatendo melhoras e avanços”, destaca Alex Bernardes.
Para finalizar, é ótimo ter em mente que uma pesquisa da plataforma de viagens Expedia Group concluiu que em junho de 2019, o número de turistas internacionais que se interessaram em vir para São Paulo no período da Parada LGBT+ cresceu 40% em relação ao ano passado. Com tudo isso, fica o carinhoso convite dos brasileiro à todo turista LGBT+ para conhecer nosso País e construir memórias felizes aqui, independente do mês do Orgulho. Todo mundo é sempre muito bem-vindo.