O MASP – Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, apresenta, no dia 9 de novembro de 2023, o seminário A ecologia de Monet, antecipando a exposição do MASP dedicada ao artista no ano de 2025, como parte de um programa anual inteiramente voltado às Histórias da ecologia. O encontro online e gratuito reúne estudiosos que apresentam novas perspectivas acerca da complexa relação da obra do pintor impressionista Claude Monet (1840-1926) com a ecologia e o meio ambiente.
Nas últimas décadas, pesquisas realizadas por historiadores da arte, acadêmicos, artistas e curadores apresentaram análises renovadas das obras de Monet, abordando as inter-relações dos campos da arte, da cultura e da natureza.
O objetivo deste seminário é levar ao público essas novas perspectivas, que incluem temas como os impactos das transformações ocorridas nos meios de produção e nas dinâmicas sociais na construção do imaginário impressionistas; a percepção do mundo natural como uma economia complexa e interdependente; e o princípio de uma consciência ecológica que pode se referir tanto à biologia quanto à fenomenologia.
As duas obras mais importantes do artista na América Latina A canoa sobre o Epte (c. 1890) e A ponte japonesa sobre a lagoa das ninféias em Giverny (1920-24) integram o acervo do MASP. Ambas as pinturas dialogam com os temas apresentados no seminário.
O encontro será transmitido por meio do perfil do MASP no YouTube, com tradução simultânea para Libras, português e inglês. Para receber o certificado de participação, é necessário realizar um cadastro por meio de um link que será fornecido durante o seminário.
A iniciativa tem a organização de Adriano Pedrosa, diretor artístico, MASP, e Fernando Oliva, curador, MASP.
PROGRAMAÇÃO
10H30—10H40
INTRODUÇÃO
Fernando Oliva, curador, MASP
10H40—12H
Mesa-redonda
CAROLINE SHIELDS
A ecologia industrial de Monet
Enquanto vivia em Argenteuil, Monet retratou fábricas, pontes ferroviárias e o rio Sena com um cuidadoso equilíbrio entre a natureza, as atividades humanas e a indústria. Seria essa harmonia uma visão do que atualmente chamamos de “ecologia industrial”? Sabemos que o Sena, imaculado e cintilante nas mãos de Monet, na verdade era muito poluído nos anos em que ele viveu em Argenteuil — o sonho que ele imaginou já estava se esvaindo. Em suas pinturas do terminal rodoviário de Paris Gare Saint-Lazare, a relação entre a humanidade e a indústria não é vista à distância, mas encarnada — essas pinturas afetivas e carregadas em termos sensoriais tensionam a experiência do corpo humano em meio a máquinas enormes. Após isso, Monet abandonou o tema da indústria por décadas, voltando a ele apenas em Londres, onde os subprodutos da indústria impregnam o ar. A observação das pinturas de Monet em Argenteuil, Paris e Londres através das lentes da ecologia industrial permite analisar as diferenças na relação do artista com a natureza e com a indústria entre esses trabalhos.
Caroline Shields é curadora de Arte Europeia na Art Gallery of Ontario (AGO), em Toronto. Possui doutorado em História da Arte pela Universidade de Maryland, tendo analisado em sua tese as naturezas-mortas de Paul Gauguin e a história da memória.
MARIANNE MATHIEU
Monet jardineiro e paisagista: a visão da Arcádia e o romantismo da poluição
A figura de Monet — pintor e jardineiro — líder do impressionismo, por um lado, e criador do famoso jardim de Giverny, por outro, tornou-se um símbolo da ecologia no contexto cada vez mais grave da crise climática mundial. Por meio da evocação de seu trabalho como jardineiro e pintor, a palestra propõe lançar luz sobre a relação de Monet com a natureza como um todo — e com a paisagem em particular —, a fim de destacar dois elementos antagônicos de sua abordagem: a celebração de uma natureza árcade e a atração por certos aspectos poluentes do “mundo moderno” em uma abordagem que poderia ser descrita como romântica.
Marianne Mathieu é historiadora de arte que criou o Departamento de Relações Internacionais do Musée d’Orsay. É também autora de ensaios e livros sobre Claude Monet e o impressionismo.
Mediação: Fernando Oliva, curador, MASP
12H—13H
Intervalo
13H30—15H
Mesa-redonda
NICHOLAS MIRZOEFF
Mudança para o vermelho: o anestésico de Monet para o Antropoceno (1870-1877)
Nos sete anos que se seguiram a seu retorno da fumaça de Londres, onde havia se abrigado durante a Guerra Franco-Prussiana e a Comuna de Paris (1870-1871), Claude Monet transformou a arte moderna. Suas paisagens urbanas de Le Havre, Paris e Argenteuil foram criadas por meio de uma combinação de pontos de vista elevados e estáticos com o que a curadora Anne Roquebert denominou “escrita automática”. Monet encontrou uma nova realidade para além do que havia sido conhecido ou percebido anteriormente. Em 1877, Monet viu vapor azul e branco na Gare Saint-Lazare, em vez de fumaça preta. A tarefa proposta pela palestra consiste em desfazer e desaprender os anestésicos automáticos de Monet para recuperar a mudança para o vermelho.
Nicholas Mirzoeff é professor de Mídia, Cultura e Comunicação na Universidade de Nova York.
STEPHEN EISENMAN
Pinturas em série: Monet e a imagem da mudança climática
As pinturas de Monet são um verdadeiro livro didático da natureza, cujo significado se altera conforme a relação de cada geração com o mundo geofísico e sociopolítico. Para o público que vivia em uma França cada vez mais industrializada, poluída e instável em termos políticos e econômicos no final do século 19, a série de pinturas deve ter correspondido ao tão desejado alívio das pressões sociais e do mercado. Atualmente, entretanto, as pinturas de Monet sugerem uma crise diferente: o desafio existencial do aquecimento global. Elas não se referem propriamente às mudanças climáticas — o artista poderia ter apenas uma compreensão mínima sobre o fenômeno —, mas Monet era uma espécie de cientista natural, e sua arte, uma investigação sobre o caráter material e óptico do mundo geofísico. Assim, suas pinturas sugerem duração, transformação, deterioração e intervenção humana nos sistemas ecológicos. Além disso, incentivam os espectadores da atualidade a considerarem as causas e os impactos catastróficos das mudanças ambientais e do aquecimento global, assim como as ações que podem ser tomadas para impedi-los.
Stephen Eisenman é professor emérito de História da Arte na Northwestern University e autor de diversos livros.
Mediação: Laura Cosendey, curadora assistente, MASP
15H—16H30
Mesa-redonda
GÉRALDINE LEFEBVRE
Monet: primeiras explorações do território normando
“São tão belos, o mar e o céu, os animais, as pessoas e as árvores da forma como a natureza os criou”, Boudin a Monet. Ecologia, um termo cunhado em 1866 pelo biólogo darwinista Ernst Haeckel, estuda as relações de todos os seres vivos entre si e com o ambiente em que vivem. Em seus primeiros anos, Claude Monet prestou muita atenção ao ambiente natural no qual cresceu. Juntamente com Eugène Boudin, ele aprendeu a trabalhar “no campo”. Para o jovem caricaturista, isso foi uma revelação. Ele entendeu a natureza e passou a analisá-la de uma maneira quase científica, “com um lápis em suas formas”. Por meio do estudo do primeiro caderno de esboços, desenhado no verão de 1856, a conversa se concentra na cartografia da Normandia produzida pelo artista (de Sainte-Adresse à Ingouville, de Montivilliers à Harfleur). Em seguida, por meio da análise de suas primeiras pinturas, será analisado como ele reuniu os elementos que constituem seu cenário natural, ao desenvolver sua própria forma de consciência ecológica.
Géraldine Lefebvre é formada pela École du Louvre, em Paris, e doutora em História da Arte pela Universidade Paris Nanterre.
MARIA GRAZIA MESSINA
Uma ecologia da visão: as pinturas de Monet na Normandia
As campanhas de pintura ao ar livre promovidas por Claude Monet na costa da Normandia entre 1881 e 1885, frutos de suas caminhadas e aventuras nos penhascos de Étretat, foram vistas como os primeiros sinais de uma consciência ecológica. Monet oferece uma visão intocada desses locais que ele vivencia como uma espécie de reserva natural e paisagística não contaminada, retirando de maneira sistemática todos os aspectos da indústria pesqueira e do turismo contemporâneos em expansão. Essa abordagem supostamente ecológica deve ser vista de modo mais pertinente, não tanto em termos da comum percepção de uma relação orgânica e desejável com a natureza, mas em termos de uma ecologia estrutural e efetiva da visão. No caso de Monet, isso pode ser comprovado por uma nova abordagem de suas obras, assim como por fontes escritas e documentação crítica. As pinturas de Monet testemunham uma forma complexa de ver, na qual um enérgico fluxo de informações é compilado por meio do movimento e com a participação de todo o sistema psicomotor, em sua adaptação e orientação em um contexto ambiental envolvente.
Maria Grazia Messina tem como principal área de pesquisa as ligações entre artes, crítica e literatura nos séculos 19 e 20.
Mediação: Isabela Ferreira Loures, assistente curatorial, MASP
16H30—18H
Mesa-redonda
MICHAEL J. CALL
A ciência de Darwin e a evolução da estética de Monet
A técnica artística madura de Monet, assim como a teoria de Darwin, enfatiza a relação de parentesco da humanidade com todos os seres vivos. No mundo de Darwin, a humanidade compartilha uma origem comum com todos os outros organismos; como deles descendemos, estamos então ligados a eles em uma espécie de parentesco biológico. Em oposição à arte pós-renascentista, que prioriza a presença humana tanto na representação quanto no ato de ver, a arte de Monet cria um senso de igualdade virtual e visual, de unidade e uniformidade entre todos os fenômenos observáveis. Portanto, o ser humano — e, por extensão, o espectador — não é representado de forma separada da natureza, como um observador desinteressado ou uma criação única, nem como se fosse superior a ela, mas, sim, incorporado a ela e em condição de igualdade em relação a todas as outras formas de vida orgânica que o cercam. Essa abordagem, ao mesmo tempo em que reflete a admiração quase reverencial que Darwin exprime em seus escritos sobre a natureza e suas leis, também relembra a humanidade de sua própria fragilidade e das difíceis escolhas que devem ser feitas para evitar a extinção.
Michael J. Call é professor emérito de Ciências Humanas Interdisciplinares na Brigham Young University (BYU) em Provo, Utah (EUA).
ANA GONÇALVES MAGALHÃES
“Um jardim de cores, mais do que de flores”: Monet em Giverny e suas pinturas do MASP
O estabelecimento de Monet e sua família em Giverny inaugurou um novo período na sua produção artística, que culminou com suas famosas séries de pintura e seu projeto decorativo das ninféias, hoje instalado no Musée de l’Orangerie. Ao comprar uma propriedade ali, às margens de um pequeno afluente do rio Sena, o pintor projetou um jardim com plantas exóticas, empregou vários jardineiros, e desviou o curso do afluente, moldando a natureza no seu entorno a sua vontade de artista. Neste sentido, Magalhães abordará as duas obras de Monet no acervo do MASP, no contexto desse “paraíso artificial” que ele criou para si, tomando por modelo aquilo que os europeus do século 19 entendiam como um povo e um território intactos, isto é, o Japão — plasmado nas imagens da coleção de estampas japonesas do artista. A partir dessas premissas, a fala pretende problematizar a noção de ecologia que circulava naquele momento — algo que as várias sociedades indígenas do mundo hoje compreendem como característico de uma cultura branca e colonialista.
Ana Gonçalves Magalhães é historiadora da arte, Professora Livre-docente, curadora e, atualmente, diretora do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo.
Mediação: David Ribeiro, assistente curatorial, MASP
SERVIÇO
Seminário A ecologia de Monet
Organização: MASP
Adriano Pedrosa, diretor artístico, MASP e Fernando Oliva, curador, MASP
9.11.23
10h30—18h
Gratuito
Site oficial