Por Adriana Queiroz e Daniela Olorruama
Vivenciamos experiências inesquecíveis durante o último verão europeu. Estivemos por lá entre final de junho e término de agosto de 2017, em um pequeno país onde aprendemos mais do que poderíamos imaginar. Sim, a Dinamarca é um país encantador! E é dele que falaremos.
Comparado ao Brasil, é um país pequeno (sua área é menor do que o Estado do Rio de Janeiro), situado no norte da Europa, na região também conhecida como Escandinávia, famosa por ser a terra dos Vikings. Este, certamente, é um lugar no mundo que enche os olhos pela qualidade de vida. Há anos os dados relativos à economia, escolarização, distribuição de renda e afins são de dar inveja. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU) a Dinamarca está entre os dez melhores países do mundo para se viver.
O comportamento dos dinamarqueses ultrapassa o ideal que nós, brasileiros, temos de educação e respeito. As políticas e ações sociais do governo revelam um olhar de cuidado e preocupação com seus cidadãos. Crianças com cabelos de cor quase branca, acompanhadas de seus pedagogos, passeiam pelas ruas para conhecer a história do local onde vivem. É superdivertido ver os pequenos grupos formados por pares de mãos dadas e coletes fluorescentes, que não ultrapassam meio metro de estatura e se sentam nos bancos espalhados pelas praças para fazer o lanche. Também não é incomum visualizar homens passeando nos parques com seus bebês, enquanto suas esposas estão em outras atividades, afinal, os homens auxiliam em praticamente todas as atividades domésticas e os meninos aprendem desde pequenos que não há distinção. A equiparidade é algo cultural na Dinamarca e, dificilmente, será encontrado um dinamarquês agindo de forma contrária. Assim como é natural e comum ver uma mulher fazendo topless ou um homem trocando suas roupas na praia (cenas frequentes no verão), independentemente de suas idades e mesmo que exponham seus corpos, não serão vítimas de olhares maliciosos ou depreciativos. Não é o país da perfeição, mas em relação a outras culturas, como a nossa, está bem próximo do conceito de vida ideal.
Suas praias são forradas de pedras. Barquinhos particulares ficam ancorados no mar, em frente aos restaurantes que oferecem comidas típicas: peixe empanado, salmão, camarões com sabor único, molho remoulade, carne de porco, caviar, pepino, beterraba… A gastronomia escandinava difere, em muito, à gastronomia dos países europeus. Algumas vezes, todos estes alimentos compõem o mesmo prato de maneira bastante harmônica para serem apreciados, principalmente, com pães. Os melhores e mais variados pães, saborosos e maciços devido a riqueza de grãos e de fibras, acompanhados por cervejas de fabricação nacional, vinhos e o hildeblomst, uma bebida de flor de sabugueiro tão consumida pelos dinamarqueses quanto o suco de laranja o é por nós.
As pequenas cidades são charmosas e floridas. No município de Odense, por exemplo, no sudeste do país, a 168 km da capital, existe um pequeno lago com patos. A cidade é famosa por ser o local onde nasceu o autor de “O Patinho Feio”, Hans Christian Andersen. É o mesmo escritor de “A Pequena Sereia”, personagem que ganhou, no início do século passado, uma estátua em Copenhagen, além da adaptação cinematográfica mundialmente divulgada pela Disney e eternizada pela Ariel e seus fiéis companheiros Sebastião e Linguado.
Já Dragør, uma cidade com traços cinematográficos, fica a 14 km de Copenhagen e é possível visitar por meio de transporte público. A caminho de Gilleleje, cidade litorânea que fica 62 km ao norte do país e é considerada a “riviera” dinamarquesa, é possível visitar o Castelo de Kronborg, outro lugar encantador e inesquecível por ser o castelo do Hamlet. Isso mesmo, o aclamado escritor William Shakespeare se inspirou no monumento que fica na cidade de Helsingør ao criar um de seus mais famosos personagens, autor da célebre frase “ser ou não ser, eis a questão”.
Copenhagen é uma capital com ares pacatos, de ruas tranquilas e silenciosas, mas com grande movimentação noturna. No centro da cidade estão os bares, restaurantes, cafés, lojas nacionais e grifes de luxo, lojas de acessórios e de objetos criativos (e, muitas vezes, divertidos) de decoração, além de itens educativos para crianças, pois a maioria (se não todos) os brinquedos estimulam a criatividade e o raciocínio.
São muitas as atrações, e a melhor forma de chegar a qualquer uma delas é pedalando. Há vários pontos de aluguel de bicicletas e é possível estacioná-las em qualquer lugar da cidade, com exceção de algumas vitrines, que afixam um aviso quando não permitem bicicletas em suas fachadas por interferirem na passagem dos pedestres. Eis um ponto crucial da mobilidade urbana: os transeuntes estão sempre em primeiro plano.
Em frente à principal praça da cidade, Kobenhavns Radhus, a praça da prefeitura, temos o parque Tivoli, que julgamos ser uma atração obrigatória e que merece um dia de dedicação. É um dos parques de diversões mais antigos do mundo, localizado na região central, onde aproveitamos para brincar, apreciar os belos jardins, comer a famosa costela de porco no restaurante Promenade (hummm, uma delícia gastronômica! Aliás, na Dinamarca tem mais porcos do que pessoas) e, ao escurecer – cabe ressaltar que no verão isso só acontece a partir das 21h – nos deslumbramos com a iluminação. Tenha paciência e fique até o horário do fechamento do parque, pois o show de fogos de artifícios vale a espera.
Já a estátua da Pequena Sereia é linda e delicada. Fica um pouco afastada do centro, em Kastellet, uma cidadela dentro de Copenhagen, a cerca de 20 minutos de bicicleta. Chegando em frente à estátua, porém, muitos e muitos turistas estarão disputando espaço para tirar uma foto, mas não se acanhe na hora de registrar esse momento. A cidadela, ou seja, a fortaleza foi construída de forma estratégica à beira do oceano, por onde é possível fazer uma tranquila caminhada, admirando a paisagem e seguindo o layout inusitado que remete a uma estrela. Os canhões ainda estão por lá e oferecem um belo contraste entre o passado e o presente, o épico e a modernidade.
Há grandes canais em Copenhagen, e um programa imperdível é o passeio de barco, no qual os guias contam as curiosas histórias das construções da cidade. Para este passeio o destino deve ser o novo porto Nyhavn, uma área da cidade famosa por suas antigas casas de fachadas coloridas, um cartão postal conhecido mundialmente, onde restaurantes servem comidas típicas dinamarquesas. De lá saem os barcos e, para fazermos este passeio, escolhemos um dia bastante ensolarado, uma vez que nem todos os dias do verão dinamarquês são de muito sol. Comprar uma cerveja dinamarquesa e sentar nas muretas entre os barcos particulares e as casas coloridas para curtir o clima do local é uma boa experiência.
Perto de Nyhavn, atravessando o canal, foi inaugurado há poucos anos o mercado de comida de rua Papirøen. Visitamos o local em um dia chuvoso e, obviamente, de bicicleta, pois, como dizem os dinamarqueses, não existe tempo ruim, existe roupa errada. Com isso, estávamos bem equipadas com nossas capas de chuva. Encontramos comidas de vários países, inclusive do Brasil, além de muitas pessoas bonitas e animadas.
Saindo de Papirøen e pedalando mais um pouco, chegamos a Christiania, o famoso bairro hippie, que destoa bastante do restante da cidade. Quando observamos os moradores, o estilo das casas, o comércio de roupas e acessórios hippies, além de objetos relacionados ao consumo de maconha, percebemos essa diferença. O local recebe turistas e curiosos de todas as partes do mundo e, algumas vezes, a visita de policiais.
Andando pelo centro histórico e comercial (andando mesmo, pois não é permitido pedalar nesta área), aproveitamos para visitar a mais antiga torre de observação da cidade, Rundetaarn. A subida nos tempos antigos era realizada por meio de carruagem pelos reis, mas nós a fizemos a pé, uma subida agradável de, aproximadamente, 15 minutos. Vale a pena, a vista da cidade é encantadora.
Algumas construções, além das já citadas, são de visita obrigatória, como:
Gliptoteca Ny Carlsberg: a coleção do museu que reúne o maior acervo privado de obras de arte antigas, com belíssimas esculturas e pinturas, teve seu início com Carl Jacobsen, filho do fundador da cervejaria Carlsberg, que também pode ser visitada em dias específicos.
Museu Nacional de Arte: tem obras do período do Renascimento até os dias atuais. O museu contém pinturas, esculturas e artes em papel de grandes artistas como Modigliani, Rembrandt, Picasso e Matisse, além de alguns dinamarqueses.
Castelo de Rosenborg: com estilo arquitetônico renascentista, tem mais de 400 anos e já foi residência da família real. Hoje guarda as joias da rainha, os tesouros reais e obras de arte.
Palácio de Amalienborg: na verdade, são quatro construções distribuídas simetricamente em uma praça de formato octogonal, que em seu centro recebe a escultura de Frederik V. A família real dinamarquesa tem sua residência oficial neste palácio e é possível assistir à troca da guarda. Mantenha certa distância dos guardas para não se assustar com a advertência. Fotos dos guardas são permitidas, mas com parcimônia, jamais se aproxime demasiadamente deles. A partir deste complexo e em direção às águas, podemos ver a Casa de Ópera de Copenhagen. Seguindo em direção contrária, encontra-se a Igreja de Mármore ou Marmorkirken. Os três pontos estão alinhados simbolizando a união entre religião, realeza e cultura.
A Dinamarca é o único país no mundo que reúne, em uma mesma construção, os três poderes: executivo, legislativo e judiciário. Essa construção é o Palácio de Christiansborg, endereço do parlamento dinamarquês.
Próximos ao centro estão os cinco lagos, local onde as pessoas sentam para conversar, comer, namorar ou apenas fazer nada enquanto aproveitam o tão escasso calor proporcionado pelo sol do verão. A partir dos lagos e com o mapa da cidade em mãos, fica muito fácil se localizar para encontrar as atrações turísticas e os endereços dos bares e baladas gays de Copenhagen.
Noite LGBT
São muitas as opções para a noite, pois, como explicamos no início, o dinamarquês, naturalmente, se dirige a todos de maneira idêntica. Não se assustem se falarem contigo no idioma local (dinamarquês), eles partem do pressuposto de que todos são cidadãos do país. No entanto, praticamente todos os nativos da capital falam inglês. Dessa forma, é comum que o público gay seja visto em qualquer bar ou balada da cidade, recebendo tratamento igualitário e curtindo o ambiente. Mas estar nas baladas direcionadas aos gays é sempre mais divertido para nós.
Como a maioria dos habitantes da cidade trabalha até às 16 horas, os bares lotam suas mesas cedo e, a partir deste horário, sempre haverá um happy hour acontecendo, com promoção de bebidas. Mas como os dias são longos no verão, é importante ficar atento ao relógio para não perder os descontos. Algumas vezes, tivemos a sensação de estar no final da tarde quando, na verdade, o dia já se findava. A parte divertida é que a timidez dinamarquesa tende a desaparecer após algumas horas de bebedeira.
Algumas casas abrem durante a tarde em um esquema de bar e, ao anoitecer, oferecem um clima de balada, como é o caso do aconchegante e acolhedor My Fair Ladies, que se encontra no centro, e que, confessamos, ganhou nossa admiração pela decoração, pelo happy hour, mas, principalmente, pelo atendimento. É uma casa animadíssima para homens gays, mas lésbicas também aparecem por lá. Pendurado no teto, acima das mesas, as luminárias são divertidas cartolas. Enquanto a música toca bastante animada com sons pop, sucessos internacionais e paródias do mundo gay, a televisão mostra seus respectivos clipes. Os atendentes estão sempre animados, conversam e brincam com os clientes, além de se empenharem para atender bem. É permitido fumar dentro do local.
Próximo dali está o Centralhjørnet, que existe desde 1917, ou seja, acaba de completar 100 anos! Pensando que, em São Paulo, as primeiras baladas gays surgiram no início da década de 70 e de forma camuflada, este centenário clube nos ajuda a compreender a maturidade do dinamarquês quando o assunto é homossexualidade.
Também no centro encontra-se o Oscar Bar & Cafe, frequentado pelo público masculino mais do que pelo feminino. Funciona apenas como bar e suas mesas lotadas ocupam a grande calçada em frente ao estabelecimento. Dentro do bar, enquanto se espera pela bebida, é mais fácil de paquerar do que do lado de fora. Os dinamarqueses são bastante discretos na paquera, mas a timidez, como dissemos, diminui após alguns drinques e taças de cerveja.
Já o Cosy Bar, que existe desde 1941, é um pouco mais exigente para entrar, porém, é conhecido como um ótimo lugar para conhecer rapazes. Drag DJs animam bastante o local, que funciona até o dia amanhecer. A cerca de duas quadras dali está o G*A*Y Copenhagen, que é um bar e balada conhecido por receber pessoas de todas as idades, desde que maiores de 18 anos.
Para uma experiência inusitada, o Jailhouse é uma perfeita opção. É um bar e restaurante onde o tema é prisão. O local é decorado com grades e os atendentes usam uniformes de policiais. O restaurante serve comidas típicas dinamarquesas e o bar tem coquetéis muito criativos. Na mesma rua está o animado Masken Bar, recebendo todos os tipos de pessoas em um ambiente alegre de dois andares.
Também para beber e comer algo, mas com um pouco mais de tranquilidade, o Café Obelix é uma boa opção. Com mesas em uma grande calçada, é um endereço gay, mas frequentado por público misto.
Em uma das ruas atrás do Tivoli, um pouco afastado dos demais bares e baladas, está o Vela Club, uma balada pequena e bastante intimista para lésbicas. A música é boa, divertida e atual. O atendimento é ótimo, mas quem anima mesmo a casa são as clientes, que começam a noite conversando e bebendo com as amigas e, ao final, estão na pista dançando e se divertindo muito. A decoração da casa é antiga, com traços do art déco, madeiras entalhadas e alguns tecidos aveludados. Conta com poucas mesas e uma delas é de pebolim, por isso, chegue cedo – o que vale para a noite dinamarquesa em geral, como já comentamos. Dentro do Vela Club não é permitido fumar, o fumódromo se faz na calçada, onde é possível fazer amizade com as meninas que se mostram bastante abertas a conversa, até mesmo aquelas que não falam inglês, o que deixa a interação ainda mais divertida.
Parada do Orgulho Gay de Copenhagen
Por sua vez, a Parada do Orgulho Gay de Copenhagen 2017 apresentou uma agenda bastante interessante de shows e discursos de amor e inclusão. A organização do evento contou com a ajuda de voluntários e patrocínio de empresas nacionais.
A maioria dos eventos aconteceu na Kobenhavns Radhus, a praça da prefeitura. Durante a semana, além de frequentar os bares e baladas, assistimos também a shows de cantores locais famosos, como a artista Nabiha, que era a atração mais esperada e fez os presentes saírem do chão cantando e dançando, mesmo com o tempo chuvoso (já explicamos o que pensam os dinamarqueses sobre os dias de “tempo ruim”). Não esqueça sua roupa de chuva, qualquer coisa é só comprar uma por lá para não perder nada, porque eles não param por conta das alterações climáticas. Um desfile de drag queens muito divertido, na mesma praça, também animou bastante um dos finais de tarde da semana.
Diferente de São Paulo, onde acontece aos domingos, a Parada acontece aos sábados em muitos países da Europa. Em Copenhagen não foi diferente. O dia estava ensolarado e as ruas coloridas em quase toda a cidade.
Fomos para o local de saída dos caminhões temáticos e abertos que carregavam caixas de som e pessoas animadas pelas ruas. Por lá não tem trio elétrico, vai de caminhão turbinado mesmo. Muitos moradores assistiam ao desfile de suas janelas, outros muitos estavam nas calçadas com crianças que se divertiam com toda aquela festa. Como nós não nos cadastramos para desfilar em nenhum dos caminhões, fomos caminhando pela calçada, acompanhando e nos divertindo na “pipoca”.
Cada veículo era dedicado a um tema e vimos caminhões de lésbicas jovens, de lésbicas não tão jovens assim, de empresas com funcionários que levaram suas famílias, caminhões apenas com homens. E todos seguiam enfeitados e animados em direção à praça da prefeitura. Além das fantasias maravilhosas, também vimos mulheres com seios à mostra e homens totalmente nus que, por mais que chamassem a atenção de todos, recebiam sorrisos e respeito.
Após a chegada de todos os caminhões, mais discursos de amor, respeito e acolhimento aos gays estrangeiros que vêm de culturas homofóbicas, boa parte proferidos em inglês, além do dinamarquês. Muita música e shows aconteciam, simultaneamente, nas ruas próximas à praça principal. Muita alegria e diversão. Conhecemos pessoas de outros países europeus que estavam em Copenhagen para o evento e encontramos alguns brasileiros e pessoas apaixonadas pelo Brasil.
Durante o verão europeu, também desfrutamos da Parada do Orgulho Gay em Amsterdan e visualizamos como ambos os eventos se estendem para além das ruas demarcadas para sua realização. A população adere, praticamente, de modo integral à programação, inclusive o transporte público, o comércio e a cidade em geral.
Os dinamarqueses, apesar de comedidos, adoram um bate papo e uma boa bebida, o que se expressa nas calçadas e ruas lotadas, todas enfeitadas para a Parada. Se o nosso relato despertou interesse, já se organize para desfrutar as delícias que a Escandinávia reserva e nos vemos por lá no próximo verão. Em 2018, a parada será realizada no dia 18 de agosto, mas as atividades duram a semana inteira – de 13 a 19 de agosto. Não tenha dúvida Copenhagen recebe a diversidade com muito amor e respeito!